segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Enquanto isso

Li recentementeum artigo do Zizek, o qual reproduzo mais adiante. Fiquei pensando sobre o incomodo que são a falta de propostas dos movimentos ocupadores recentes do ocidente, diferente das revoluções que ocorreram no Oriente.
Zizek tece um argumento que no mínimo provoca. Diz que o silencio é parte fundamental para se criar algo novo e não aderir na próxima campanha Democrata. Contudo este "não ter nada a propor" me incomoda porque parece que o evento(a ocupação) é o final de tudo, só que defender bandeiras não é garantia do contrário.
Tempos sombrios vivemos, mas segundo o artigo, só se chega a primavera quem hiberna.
É dificil pensar em um mundo de mudanças cosntantes. Será que a verdadeira resposta não foi jogada na lixeira em uma onda renovadora qualquer?

De qualquer forma, Zizek neles!

O violento silêncio de um novo começo ~ Slavoj Zizek

[IHU, 18 nov 11/El País, 17 nov 11; tradução Cepat] O que fazer depois da ocupação de Wall Street, com os protestos que começaram longe (Oriente Médio, Grécia, Espanha, Reino Unido) atingiram o centro e agora, fortalecidos, estão se espalhando pelo mundo? Um dos maiores perigos que enfrentam os manifestantes é enamorarem-se por si mesmos. Em São Francisco, numa concentração de solidariedade a Wall Street, no 16 de outubro de 2011, se ouviu um convite para participar no protesto, como se fosse uma concentração hippie dos anos sessenta: “Perguntaram qual é o nosso programa. Estamos aqui para nos divertir”.
Organizar uma acampamento é legal, mas o que realmente importa é o que sobra no dia seguinte, o que muda em nossa vida cotidiana. Os manifestantes devem enamorar-se do trabalho duro e paciente. Não são um final, mas um começo, e sua mensagem fundamental é: quebrou-se o tabu, não vivemos no melhor mundo possível, e temos o direito e mesmo o dever, de pensar em alternativas. Em uma espécie de tríade hegeliana, a esquerda ocidental voltou aos seus princípios depois de abandonar o chamado “fundamentalismo da luta de classes” pela pluralidade de lutas anti-racistas, feministas, etc, o problema fundamental volta a ser o “capitalismo”. A primeira lição deve ser: não devemos culpar as pessoas, nem atitudes. O problema não é a corrupção ou a ganância, é o sistema que nos empurra a ser corrupto. A solução não é “a rua em frente a Wall Street”, mas sim mudar o sistema no qual a rua não pode funcionar sem Wall Street.
Resta um longo caminho a percorrer, e em breve será preciso enfrentar as perguntas realmente difíceis, não sobre o que não queremos, mas sim sobre o que queremos. Que organização social pode substituir o capitalismo atual? Que tipo de líderes precisamos? Que organismos, incluindo os de controle e de repressão? É evidente que as alternativas do século XX não funcionaram. Embora a “organização horizontal” das multidões concentradas, com a sua solidariedade igualitária e seus debates abertos, resulte em algo emocionante, não devemos esquecer o que escreveu Gilbert Keith Chesterton: “Ter uma mente aberta, em si, não é nada; o objetivo de abrir a mente, como o de abrir a boca, é poder fecha-lá com algo sólido dentro”. O mesmo acontece com a política em tempos de incerteza: os debates abertos precisam se misturar com novos significantes fundamentais, mas também em respostas concretas para a velha questão leninista: “O que fazer?”.
É fácil responder aos ataques conservadores. São anti-americanos os protestos? Quando os conservadores fundamentalistas afirmam que a América é uma nação cristã, convém lembrar o que é o cristianismo: o Espírito Santo, a comunidade livre e igualitária dos que tem fé unidos pelo amor. Os manifestantes são o Espírito Santo, enquanto que em Wall Street, os pagãos adoram a falsos ídolos. São violentos os manifestantes? É verdade que a sua linguagem pode parecer violenta (ocupação e outras mensagens similares), mas são no sentido da violência de Mahatma Gandhi.
São violentos porque não querem que as coisas continuem como antes. Mas que violência é essa comparada com a violência necessária para manter o bom funcionamento do sistema capitalista mundial? Eles são chamados de perdedores, mas não estão os verdadeiros perdedores em Wall Street, os que foram resgatados com o nosso dinheiro, centenas de milhares de milhões? Eles são chamados de socialistas, mas nos Estados Unidos já existe um socialismo para os ricos. Eles são acusados de não respeitar a propriedade privada, mas a especulação que levou ao crash de 2008 acabou com milhares de propriedades privadas, conquista a duras penas, basta lembrar as centenas de execuções hipotecárias.
Eles não são comunistas, se por comunismo, nos referimos ao sistema que merecidamente veio abaixo em 1990, e lembramos que os comunistas que restam hoje, governam o capitalismo mais cruel existente (China). O sucesso do capitalismo comunista chinês é um mau presságio de que o casamento entre capitalismo e democracia está aproximando-se de um divórcio. O único sentido em que podem ser chamados de comunistas é que se preocupam com os bens comuns da natureza, do conhecimento – algo que o sistema está colocando em perigo.
Desprezam-lhes por serem sonhadores, mas os autênticos sonhadores são aqueles que pensam que as coisas podem continuar indefinidamente como estão, com meras mudanças superficiais. Não são sonhadores, é o despertar de um sonho que está se tornando um pesadelo. Não destroem nada, reagem diante da auto-destruição gradual do proprio sistema. Todos conhecemos a típica cena do desenho animado: o gato chega a beira do precipício, mas continua andando em frente, sem saber que já não tem chão sob suas patas, e não cai até que olhe para baixo e veja o abismo. Os que estão fazendo os manifestantes é lembrar aos que têm o poder que precisam olhar para baixo.
Essa é a parte fácil. Os membros do movimento devem cuidar-se dos inimigos e, sobretudo, dos falsos amigos que fingem apoiá-los, mas estão fazendo todo o possível para esvaziar o protesto. Igual ao que nos dão café descafeinado, cerveja sem alcool, o poder tentará transformar os protestos em um gesto moral e inofensivo. No boxe, “abraçar-se” é agarrar o corpo do oponente com os braços para impedir ou dificultar os golpes.  A reação de Bill Clinton aos protestos em Wall Street é um exemplo perfeito do abraço político. Clinton acredita que os protestos são “no conjunto … algo positivo”, mas o preocupa que a causa seja tão difusa: “Devem defender algo concreto, não apenas serem contra, porque se limitam a serem contras, outros irão preencher o vazio que deixam”, disse ele. Clinton sugeriu que os membros do movimento apoiem o plano de emprego do presidente Obama, que segundo ele criará “dois milhões de empregos no próximo ano e meio”.
No que é preciso resistir nessa etapa, é precisamente nesse desejo de traduzir rapidamente a energia do protesto numa série de demandas “pragmáticas” e “concretas”. É verdade que os protestos criaram um vazio: um vazio no terreno da ideologia hegemônica, e precisa-se de tempo para preenchê-la, mas é um vazio carregado de conteúdo, uma abertura para o novo. Os manifestantes sairam as ruas, porque estão cansados de um mundo em que reciclar latas, doar alguns dólares para obras beneficientes ou comprar um cappuccino no Starbucks porque 1% vai para o Terceiro Mundo basta para se sentir confortável. Depois de terceirizar o trabalho e a tortura, depois que as agências matrimoniais começaram a terceirizar até mesmo as relações, perceberam que deixaram por muito tempo os outros cuidarem da política e querem recuperar esse tempo agora.
A arte da política é também insistir em uma reivindicação concreta que, embora seja totalmente “realista”, rompe a ideologia hegemônica, ou seja, que, embora viável e legítima, na prática, é impossível (por exemplo, o direito a saúde universal nos EUA). Depois dos protestos de Wall Street, devemos mobilizar as pessoas para essas reivindicações, mas é muito importante manter distância do terreno pragmático das negociações e das propostas “realistas”. Não devemos esquecer que qualquer debate que se faça aqui e agora, continuará sendo feito no campo inimigo, e levará tempo para consolidar novos conteúdos. Tudo o que digamos agora poderão tirar de nós (recuperar); tudo menos o nosso silêncio. Este silêncio, esta recusa ao diálogo, aos abraços, é o nosso “terrorismo” tão ameaçador e sinistro como deve ser.

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